domingo, janeiro 22, 2012

Ajudando aprender a perceber...

"Carne mais barata do mercado é a carne negra" (Seu Jorge, Marcelo Yuca e Wilson Capellette)






Modelo, bonito, lindo, maravilhoso e na crista da onda, escolhido para participar do atual BBB, lá foi o Daniel, sorridente e alto confiante como o único representante assumido da raça para o horário nobre da Globo. Não vacilou, nas suas primeiras palavras quando questionado pelo apresentador sobre as cotas, ele respondeu ser contra, pois, afinal (segundo ele) “somos todos iguais, o sangue é o mesmo” e o negão arrancou aplausos dos companheiros presentes. – Taí, ganhei uma moralzinha com a galera e de quebra o público lá fora já está comigo, porque afinal, ninguém gosta de preconceito! (pensou o afro representante). Somos todos iguais, mas não no BBB, para participar os candidatos, que são milhões, tem que passar por uma seletiva que vai dês dos antecedentes criminais, passando pelos QIs de curto alcance e chegando na extravagante personificação do corpo. Não pode ser feio, desdentado e nem ter cabeça chata, tem que ter o padrão global, que de certa forma não é como a maioria da população brasileira. Para lá estar é preciso passar por uma cota, talvez o Daniel não tenha se atentado para isso, mas e daí, ele chegou com os seus próprios méritos, ou melhor, se encaixou no padrão contista do programa e ninguém poderá dizer que os negros não estão representados. - Obá (digo eu ), estamos representados mas essa representação é contra as cotas, mas o Daniel também não é aquele nego tição, digamos que é um tipo mais ou menos aceito pelo mercado. Muitos negros e brancos também são contra as cotas, mas para muitos jovens pretos, pardos, de cabeça chata e brancos pobres das periferias, as cotas são as únicas oportunidades que esses têm para ingressarem nas Universidades. Como numa seletiva do BBB, as representações dos afros descendentes que entraram pelos méritos numa USP e UNICAMP, não ultrapassam 000,3% e quando estão lá, enfrentam preconceitos internos como aconteceu com aquele estudante negro que foi barbarizado no Campus da USP pela PM. Mas o Daniel não tem culpa em estar em lugares onde tradicionalmente os negros não estão. Acostumado com o mundo fashion, ele bem sabe que na propaganda há negros fazendo comerciais, mas não há negros ‘garotos propaganda’, o último que se tem notícias foi o Sebastian da C&A. Ele, o Daniel deixou de ser esse garoto propaganda na África, para poder participar desse reality show não só para ganhar os R$ 1.5 mi, mas também e principalmente ter mais projeção na mídia e descolar uns contratos bacanas de algumas agências e quem sabe, participar do Zorra Total. Infelizmente não deu tempo, a sua eliminação por falta grave (segundo a Globo) acabou com a nossa representação. Como numa escola pública, onde jovens são precocemente excluídos do sistema educacional, assim foi o Daniel no BBB, não foi para o paredão e nem foi votado para sair, simplesmente foi extirpado da parada. Pensando ser iguais a todos, ele caiu na armadilha da falsa democracia racial, pois, utilizando do seu poder de sedução, foi lá fretar com a patricinha no edredom depois de uma balada etílica, afinal, todo mundo fica debaixo desses edredons, faz parte do jogo e da um tremendo IBOP, campeão de audiência para a Globo e etc e etc, eu com um bom negão (pensa ele), vou fazer valer os meus dotes sem discriminação. Mas o que esperar desses selecionáveis participantes do BBB? Os que lá estão levam consigo todos os seus arquétipos sociais com excesso de egoísmo, prepotência , vulgaridade e machismo ao extremo, parece que, para estar lá é preciso cometer pecados, não podem ser verdadeiros e íntegros, assim o Daniel se comportou, sujeito pegador, moderninho e com muita sede ao pote, mas para quem se diz ser contra as cotas, para ele a sua não passou de uns ‘esfrega- esfrega’ e o pio, poderá ser acusado de estupro. Faço aqui alguns questionamentos: imaginamos se a Monique fosse uma negra e o Daniel um homem branco? Estupro não tem cor, mas, como seria o foco dessa discussão? Será que nas redes sociais e imprensa, ela não estaria sendo tachada de aproveitadora, dissimulada e Maria BBB? Afinal, o cara é homem e ela deu mole! (pensam assim a sociedade). Neste caso, somente o movimento de mulheres negras estaria denunciado o ocorrido. Na verdade, em todas as edições desse programa, os edredons sempre rolaram livre, leve e solto e é questionável que, em horário nobre, cenas de alcoolismo, sexo, soberbas e luxuria seja o grande presente da Globo para as crianças em férias. O BBB não condiz em nada com a sua proposta de vigiar a realidade, ele simplesmente virou mais uma novela de ficção e nada tem haver com um programa de grade familiar. Paralelamente, o suposto estupro denunciado pelas redes sociais, o desligamento do Daniel do programa e os debates em torno desse caso, revela três aspectos importes: o primeiro é a negação da raça diante do seu espaço comum, isto é; o debate fica mais acirrado quando se discute o papel do negro em lugares que tradicionalmente não é o seu. Não foi polemico quando o Alemão ficou debaixo dos edredons com várias mulheres e inclusive alcoolizadas e estáticas, segundo; o modelo de programa que ataca pejorativamente e expõe as mulheres em situações de exploração sexual e terceiro; a perpetuação do machismo do século 19 que ainda ronda o século 21. Em todos os sentidos, lamentavelmente o Daniel e a Monique são mais vítimas do que culpados e inocentes, são eles na verdade frutos de uma sociedade preconceituosa que ridiculariza a si mesmo, pois assim se comporta alguns negros que são contra as cotas, mas que precisam delas pra sobreviver e/ou determinadas mulheres que se expõem ao máximo para ter uma falsa sensação de liberdade sexual e independência social. Para libertá-los dessa escravidão é preciso abolir o senso comum das mesmices impostas pelas mídias sensacionalistas, onde o desprezível vale mais que a ética e valores simbólicos de uma nação, a nossa negação racial e de gênero é imposta por aqueles que mais se beneficia com ela, pois “a carne mais barata do mercado é a carne negra”





Alceu



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